Apresentação do álbum Badyo
“Este é o nome por que é conhecido hoje o habitante de Santiago, a primeira ilha a ser habitada no Arquipélago de Cabo Verde. Mas, Vadio era todo o negro que recusava a condição de escravo; e, livre, não reconhecia o controlo das instituições sociais dominantes. Ele é o Mandinga, o Mandjaco, o Pepel, o Bantu, o Congo, o Fula, o Yoruba, o Wolof vindos de Africa como escravos e que, entre outras plantações, semearam o gérmen dos nossos ritmos: Batuko, Tabanka, Funaná, Coladera, Colá, Morna, etc. Badyo é o ancestral do Homo Criolo. Não só nos trouxe ao mundo, como também ao mundo nos levou: para América do Norte, Antilhas, América Central, Brasil, Argentina, Europa, espalhando e assimilando novos ritmos além-mar, toques e tiques que um dia voltariam em instrumentos como o Bandonéon, o Cavaquinho, a Guitarra, o Piano, a Harmónica. Badyo é o homem da rota dos escravos e a sua música, a primeira música mestiça do Planeta, a música síntese do maior encontro de culturas da história. É esta mestiçagem universal que me seduz, que eu busco e proponho na reminiscência dos sons que vieram, dos que foram, e dos que regressaram. Pois, foi aqui em Santiago de Cabo Verde que as músicas dos povos e das etnias africanas (que nunca antes tocaram juntas) viraram a música africana que anunciou a música americana que tocou a música europeia que conhecerá a música do mundo que é a música de Cabo Verde, que é mais antiga do que se pensa e mais moderna do que parece.
“O que faz Cabo Verde surgir como um centro de produção de música de reconhecida qualidade? Para uns a resposta é simples: trata-se de uma ilha e as ilhas, todas elas, são espaços de criatividade musical. Como se a música fosse uma ponte para vencer a insularidade, um apelo contra a solidão secular, uma reza para vencer distâncias e esquecimentos.
Para outros a resposta não está na geografia mas na alma mestiça, na aptidão histórica dos territórios insulares para receberem e misturarem influências. A existência do ilhéu está sentada na praia, vendo quem chega e quem parte, repartida entre a raiz eterna e a permanente despedida.
Quem está condenado a rezar, tem o canto por destino: essa seria uma outra tentativa de explicação dessa aptidão musical de uma das mais jovens nações africanas.
Não creio que estas coisas necessitem de explicação. Hoje, a música confere visibilidade a um país africano. Ter a arte como rosto, num continente que apenas é notícia pela desgraça, é uma condição rara e privilegiada.
Mas este privilégio tem um senão. O mesmo sistema que ajudou a projectar Cabo Verde no mundo pode acabar por diluir aquilo que é profundamente original e diverso na música caboverdiana. Noutras palavras, o sucesso internacional da música de Cabo Verde é hoje o seu maior obstáculo. O desafio é simples e perverso: espera-se que essa arte seja fiel a si mesma e facilmente reconhecível mas é essa mesma simplificação que acabará por a derrotar e banalizar. Espera-se, assim, que a música caboverdiana se supere, se coloque em causa e invente, em si mesma, outras caboverdianidades.
Mario Lucio sabe deste repto e escolheu, desde há muito, acender outros caminhos, dar sonoridade a outras tradições que, sendo verdadeiras, são assumidamente reinventadas. O seu percurso com o grupo Simentera confirma essa preocupação de permanente renovação e ousadia. Neste álbum ele fez da reinvenção da tradição uma arma que impede que o património musical de Cabo verde seja folclorizado como “música do mundo” ou arrisque a ser moda passageira ou objecto de valor etnográfico.
Eis um outro Cabo verde, um outro Mario Lucio que não é apenas um filho da ilha. Eis um disco que se espera e que surpreende e que nos faz a nós sermos ilhéus e barcos vencendo o mar.”
Mário Lucio no OndaDjazz:
Mário Lúcio – voz e guitarra
Stephan Perruchet – percussão
Duka – guitarra
– Dia 3 (Quinta)
– 23h00
– Entrada :7€
ONDAJAZZ
Sala de Espectáculos, Bar, Restaurante
Arco de Jesus, 7 1100-033, Alfama – Lisboa
(junto ao Campo das Cebolas)
Tel: +351 218873064,Telm: 351 919184800/67
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Horário
3ª, 4ª e 5ª das 20h às 2H
6ª e Sáb. das 20h às 3H
Fecha Dom. e 2ª
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